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quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Martha Medeiros - Jornal Zero Hora - 04/11/15

Na real


Quando falo sobre minha atividade como escritora, alguns me julgam modesta, mas de modesta não tenho nada. O que tenho é uma maneira muito própria de encarar meu trabalho. É uma aventura, uma sorte, uma oportunidade, nada mais.

Como o estrelismo anda em alta, acabo passando por humilde, mas lendo o livro Grande Magia, de Elizabeth Gilbert, encontrei alguém que também tem uma ideia pé no chão sobre o que é ser um artista.

Elizabeth é autora de vários livros. Entre eles, o best-seller Comer, Rezar, Amar. Está lançando agora Grande Magia – Vida criativa sem medo, em que relata sua trajetória profissional e dá uma situada sobre como a coisa funciona.

Assumidamente autoajuda, ela incentiva o iniciante a não ter medo de ser rejeitado, medo de parecer um narcisista, medo de que todo mundo já tenha feito melhor do que ele, medo de não ter talento, medo de magoar os parentes, medo de não fazer sucesso. Comece logo, ordena ela. Criar é para os corajosos.

E faz um lembrete importante: não busque a originalidade. Eu tenho batido nessa tecla nos eventos literários em que participo, mas Elizabeth Gilbert é mais famosa do que eu, então ouça o que ela diz: “A maioria das coisas já foi realizada – mas ainda não foram realizadas por você”. Ou seja, troque originalidade por autenticidade. Faça do seu jeito e veremos o que acontece.

Pode acontecer nada. Sua arte provavelmente não será importante para os outros. Assim é. Você não veio ao mundo para salvar ninguém. Apenas faça aquilo que sabe e que lhe dá prazer. Se for bom, o resto virá por consequência. Se não for bom, ao menos você apostou. É o que somos todos: apostadores.

A certa altura, ela reproduz no livro uma resposta que Werner Herzog deu a um cineasta independente que se dizia incompreendido, esnobado, preterido, injustiçado e pobre. “O mundo não tem culpa de você ter decidido ser artista. Não é tarefa do mundo gostar dos filmes que você faz e, sem dúvida, ele não tem nenhuma obrigação de financiar seus sonhos. Ninguém está interessado. Se precisar, roube uma câmera, mas pare de reclamar e volte ao trabalho.”

O problema é que ninguém quer ser reconhecido apenas como um criador disciplinado e meia-boca. As pessoas sonham em se transformar em ícones. Ou um Walter Salles, ou nada. Ou uma Clarice Lispector, ou nem vale iniciar. Se os Titãs conseguiram, por que não eu?

Melhor reduzir as expectativas. O sucesso é um acidente. Simplesmente entre no jogo e pratique muito. Utilize seus momentos de ócio, pois durante o horário comercial será preciso dedicar-se a uma profissão que lhe sustente. Ser artista não é sua profissão. Provavelmente nunca será. E daí? Você não quer se divertir?

Se esse for o real propósito, aí, sim, a tal magia pode acontecer.



Jornal Zero Hora - 04 novembro 2015
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